26 de maio de 2009




"Deixa pra lá o que não interessa, a gente não tem pressa de viver assim
Feito platéia da nossa própria peça, histórias, prosas, rimas, sem começo e fim..."
(Fernando Anitelli)

4 de maio de 2009

Ensinamento

"Minha mãe achava estudo a coisa mais fina do
mundo. Não é. A coisa mais fina do mundo é o
sentimento. Aquele dia de noite, o pai fazendo
serão, ela falou comigo: "Coitado, até essa hora
no serviço pesado". Arrumou pão e café , deixou
tacho no fogo com água quente. Não me falou
em amor. Essa palavra de luxo. "
( Adélia
Prado )
Nei Duclós


Trago a nova: eu mudo
lento, e é tudo
Sinto ser assim
por estações: aos turnos

Posso voltar
ao ponto de partida
mas luto

Sei que vem outubro
Flores, fruto de seiva
romperão no mundo
(Trabalho duro:
sugar de pedras
rasgar os caules
colher ar puro)

Lento e bruto
eu mudo
Sei que vem
outubro
“Quero um sorriso que dure uma quadra e dobre a esquina a iluminar-me”. (Nei Duclós)
“É fácil evitar a felicidade, o difícil é escapar da dor que isso provoca”.
(Ítalo Svevo)
"Não te acorrentes ao que não vai voltar..." (Vera Americano)
Sempre tive um medo desgraçado de casas sem campainha.

A possibilidade de esperar por horas até que da janela ela me visse era, no mínimo, nauseante. Não tinha pressa, mas a ansiedade me consumia. Consumia tanto que em dez minutos tive a audácia de traçar minha história com ela, passando pelos detalhes mais remotos, como uma noite em que ela caía da escada da nossa casa e eu a socorria com o avental da cozinha e deixava o arroz grudar na panela. Depois pedíamos comida chinesa, porque nossa despensa era sempre pobre, mas ela nem se importou, e então ela apareceu na janela e sorriu angustiada. Ela me matava quando sorria dessa forma. Abriu a porta de casa, percorreu o jardim, pegou o gato cinza e gordo pelo caminho (eu sabia que era só pra não vir me olhando nos olhos), encostou no portão eletrônico e lá ficou. Perguntou o que dessa vez me movia pra zona Sul, qual desculpa eu daria dessa vez. Disse que tinha uma entrevista de emprego, semana passada tinha sido só o teste psicológico. Como me saíra? Bem, bem, eu sempre digo que me saio bem, quem sabe assim ela percebe que eu sou um cara legal e para de me tratar como se eu fosse um mendigo pedindo bolachinha na saída do mercado. Eu não estou mendigando companhia, Isabel, eu só gosto da essência de nós dois. De você mesmo e o que você acredita que nós temos, ela disse.

-É, Isabel, disso que você ajudou a construir, porque mês passado mesmo você me disse que ainda faltavam novecentos e noventa e nove anos pra alguém me separar de você.

-Você não sabe reconsiderar, acha que tudo que a gente diz é eterno. Você parece bobo, sonhando alto e querendo ficar com os pés no chão. Meu pai me disse que você é daquele tipo que morre de medo de altura e compra um apartamento na cobertura, só pra mostrar que superou e que aquilo passou. Eu também acho. Você tem mais medos que desejos e joga seu coração no chão pra eu ter o deleite de pisar. E sabe o que isso significa?

E por que diabos eu prestava atenção? Porque eu acho lindo, lindo alguém sofrer por amor. Não, Isabel, o que significa?

-Significa que eu vou pisar, sim, até você não ter mais sangue pra respingar em mim. Aí estaremos livres um do outro.

Que retardada. Não entende que a liberdade mais canta que fala e que o amor mais chora que ladra.

Isabel é mais homem que eu. Quem dera fosse ao menos travesti
(Importado de Carolina let´s Go)

"Nenhuma pessoa é lugar de repouso"
(Nei Duclós)